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OK, vamos por partes. Que a notícia parece mesmo ser um boato, parece mesmo.
Mas essa história de 80%, 100% de encargos sociais é, para dizer o mínimo, questionável. Sempre achei esses números meio malucos, por que eu não conseguia chegar nesse resultado de maneira alguma até que, faz uns anos, resolvi pesquisar o assunto.
Para se chegar nessa conta de 100% é preciso considerar que férias, décimo-terceiro, descanso semanal remunerado, etc... são “encargos sociais”. Em um mês curto como fevereiro isso dá uns 110%. Em um mês “normal” como agosto dá uns 80%. Quem quiser ver as contas e tiver paciência para ler o artigo é só clicar
aqui.
O problema fundamental com esse raciocínio, na minha opinião, é que tudo que vem parar no meu bolso, direta ou indiretamente, não é encargo social e sim salário.
Além disso, essas “regalias” ou “direitos” (dependendo da opinião de cada um) teriam sido um problema em mil-novecentos-e-pedrinha quando foram instituídos: o empregador paga X para um sujeito e, do dia para noite, o cara ganha o direito de não trabalhar um dia na semana, ficar um mês por ano sem trabalhar, etc... Mas hoje, décadas depois, quem contrata sabe quanto tempo o funcionário vai efetivamente trabalhar e quanto vai efetivamente custar.
Então não dá para considerar que esses itens sejam encargos. O descanso semanal remunerado previsto em lei tem, atualmente, apenas a função de garantir que eu não serei obrigado a trabalhar todos os dias da semana, podendo descansar um. De remunerado não tem mais nada já que o empregador sabe que eu não trabalharei um dia na semana e ajusta o salário de acordo com esse fato. O mesmo se aplica a férias e décimo terceiro.
Se você considerar que esses itens citados são salário (minha opinião) e separá-los dos encargos (contribuições que incidem sobre a folha de pagamento e são pagas ao governo) a história é outra. Citando o
Dieese:
Todas essas partes constituem aquilo que o trabalhador "põe no bolso", seja em dinheiro vivo, ou na forma de uma espécie de conta-poupança aberta em seu nome pelo empregador (o FGTS, que constitui um patrimônio individual do trabalhador).
Já os encargos sociais incidentes sobre a folha restringem-se às contribuições sociais pagas pelas empresas como parte do custo total do trabalho, mas que não revertem em benefício direto e integral do trabalhador. São recolhidos ao governo, sendo alguns deles repassados para entidades patronais de assistência e formação profissional.
Uma empresa que admite um trabalhador por um salário contratual hipotético de R$ 100,00 gastará um total de R$ 153,93. Nessa conta, está incluída a remuneração média mensal total recebida integral e diretamente pelo trabalhador (R$ 123,04), bem como os encargos sociais sobre a folha de pagamentos média mensal (R$ 30,89). Dito em outras palavras, o custo total do trabalho, incluídos os encargos sociais, supera em 53,93% o valor do salário contratual registrado na carteira profissional, percentual muito aquém dos 102% alardeados por parte expressiva do setor empresarial.
OK, a fonte é “suspeita”, mas o professor da FEA/USP que mencionei acima também não é imparcial. Mas os dados de ambos estão corretos. Quando fiz essa pesquisa mostrei esses dados a um amigo que é empresário e, segundo ele, ambos estão corretos. A questão é realmente o que se considera “encargo”.
Aliás, já ouvi alguém comentar o seguinte sobre esse assunto: salário também é um encargo para as empresas, o ideal seria que as pessoas trabalhassem de graça, aí o custo seria zero. Até hoje não sei se foi brincadeira ou sério...
Se uma reforma na legislação trabalhista vai melhorar ou não a geração de empregos, é outra discussão. Contudo eu acho meio questionável.
Por um lado o trabalhador brasileiro é muito mais barato do que um europeu ou americano, isso considerando-se o custo total. Por outro lado, mesmo sem nenhum desses encargos, custa muito mais do que um chinês, por exemplo. Nesse ponto tenho a mesma visão pessimista do Condor.
Também concordo em parte com o Urubu. Só que acho difícil acreditar que, com a extinção desses itens, haverá uma incorporação aos salários. O mais provável é que simplesmente desapareçam e o salário continue como está.
Além disso, não acho que dê para abrir mão de um sistema de previdência compulsória. As pessoas são, na maioria, imprevidentes. A tendência seria que a maioria da população não poupasse e chegasse à velhice sem nenhuma cobertura, o que seria um problema sério do ponto de vista social.
De todo modo eu acho interessante que sempre se mire nos itens que vão parar no bolso de trabalhador e nunca naqueles que são recolhidos ao governo. Creio que o assalariado deve ser um alvo mais fácil.
SP!